Há algumas semanas atrás, entrevistando um psiquiatra para uma matéria que em breve estará disponível no portal Nosso Bem Estar (www.nossobemestar.com) – perguntei a ele se o cérebro percebe os encontros presenciais de forma distinta dos virtuais. Ele foi categórico em dizer que sim. E pontou: ver o vídeo da festa não tem graça, a gente quer é estar na festa.
No último sábado, 6 de setembro, lembrei desta frase enquanto assistia ao show do gigante Gilberto Gil, verdadeiro patrimônio histórico e cultural do nosso país. Para além do fato de ter sido um dos melhores shows de todos os tempos – na minha opinião e de muitas outras pessoas – tive certeza que nenhum registro em redes sociais daria conta do que cérebros e corações presentes no estádio perceberam e sentiram naquela noite. Enquanto cantava, dançava e ouvia as músicas que marcaram a minha vida, fiquei imensamente feliz por ver cerca de 30 mil pessoas que decidiram sair do conforto de suas casas, numa noite fria, para estar ali, presencialmente. Em tempos de tantas telas e encontros virtuais, aquela celebração de corpo e alma teve um sentido de resistência à ditadura dos algoritmos que nos prendem diariamente. Presos e acomodados, nos limitamos ao cotidiano que acaba por se resumir em casa e trabalho.
Recentemente, tomei conhecimento – através de um texto da jornalista e escritora Fernanda Pandolfi, publicado na plataforma Substack (https://substack.com) – do conceito de “terceiro lugar”, termo cunhado pelo sociólogo americano Ray Oldenburg em seu livro “The Great Good Place”, de 1989. O terceiro lugar não é o lar (o primeiro) nem o trabalho (o segundo), mas um outro ambiente físico que permite o convívio entre desconhecidos, como as cafeterias, praças e grupos de interesse comum, como clubes do livro, grupos de corrida, corais, cursos de arte e tantos outros. Antídoto à solidão que marca especialmente a falta de amizades na idade adulta e na terceira idade, esses coletivos oferecem o que se convencionou chamar de pertencimento. Para Oldenberg , precisamos fortalecer o terceiro lugar como espaço de camaradagem, troca de ideias e celebração da vida. As comunidades que se formam a partir de pessoas que não se conhecem servem de alento não só para a escassez de amizades, mas principalmente para nos lembrar que esta vivência é capaz de construir uma sociedade de ajuda mútua e, inclusive, promover o engajamento nas questões sociais, políticas e econômicas da vida pública que, gostemos ou não, definem nossos destinos.
Sair de casa, ir a um show, à praça, a uma cafeteria ou participar de grupos de interesses comuns são escolhas que reforçam a nossa vitalidade, verdadeira alforria do mundo digital que, se por um lado facilita a comunicação, por outro nos aprisiona ao comodismo solitário.