Com reforma total na casa, a vassoura tem sido minha companhia diária. Dispenso a leitura para tentar controlar o pó de cimento, que pairou nas frestas do piso. É trabalho ingrato domar a poeira, mas prometi ser mais teimosa que ela.
Reformar uma casa é reconsiderar a rota da vida. Um piso desalinhado. Uma peça fora do esquadro, Janelas em descompasso. Me pergunto como eu, uma pessoa que anda de mãos dadas com a demarcação de linhas para harmonizar o olhar, conseguiu viver tantos anos nesta casa.
Viver é um desalinho de horários e vibrações. Temos a impressão de que nunca chegamos no lugar ideal. Parece que a vida se faz injusta a cada novo momento. E quando decidimos recomeçar, os imprevistos nos afogam como uma sucessão de ondas nervosas.
Desde abril leio pouco e escrevo menos. Inventei de deixar nascer uma personagem literária que me acompanha há 30 anos, a Virgínia Millo. Estou acampada dentro da minha casa e muitas vezes choro por não ter minha rotina metódica em minhas mãos. De lá para cá testemunhei enchente no estado, comprei cinco vassouras, fui caluniada, li poucos livros, tomei banho de sol, adotei três gatos e mais uma cachorra, dei gargalhadas com minha filha adolescente, fiquei noiva (sou romântica sim!), perdi algumas meias pelas casa. Quando eu consegui parar para escrever esta crônica, minha ansiedade estava aos berros. Parece que nunca faço o suficiente. Escrever me ajuda a ordenar os pensamentos e perceber que viver é algo bem comum. Não precisamos ter pressa. Não precisamos atropelar nossos sonhos. Existe um ritmo, próprio de cada um. E este é o segredo de bem viver: encontrar o seu ritmo.
Não desafie a vida. Apenas se entregue. Seja uma reforma, uma vassoura em casa ou um sonho que quer te dar a mão.