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Andarilha – Bettina Lauterbach

Temos uma incrível capacidade de nos adaptar às rotinas e operar em modo automático. Aquela história da música, todo dia ela faz sempre tudo igual… Até chegar o dia em que nem tudo é igual. Gostávamos de caminhar por aí nas férias, o horário de verão ajudava tornando as tardes compridas e convidativas e um resto de verão sempre acolhia o início das aulas; algumas vezes, na saída da escola à tardinha, voltávamos eu e as 2 meninas, caminhando, um trecho de 5km mais ou menos. Naquele dia especificamente, o horário se modificara, uma das meninas faria o turno da manhã e a outra faria o turno da tarde, e para confundir ainda mais a situação, e a cabeça da mãe, o conselho de classe adiantaria a saída do turno da tarde em 2 horas. Um banquete para quem segue o dia em modo automático. No fim da tarde, no horário dito normal, fui buscar minha filha e para minha surpresa, não havia mais nenhuma criança na escola em função do tal conselho de classe que eu havia prontamente esquecido apesar dos avisos e bilhetes assinados na agendinha. 2 longas horas haviam se passado. Naquele tempo não havia um portão da escola trancado ou com vigilância, a entrada era livre, as crianças eram simplesmente liberadas, sem muito controle. Aquele vácuo que te suga e você pensa, e agora? Estou sonhando? Morri mas passo bem? Liguei para algumas Mães de coleguinhas da turma, na esperança de que a tivessem visto ou levado minha filha para brincar em casa (como assim né?) e ninguém sabia de nada. Rodei alguns quarteirões em torno da escola, olhando cada canto e possibilidade que talvez atraíssem o olhar de uma criança de 6 anos. Fiz o caminho de volta, passei pelo centro, pelos caminhos que seriam supostamente comuns e nada… Ela tinha evaporado. Já tinham se passado então 3 horas da saída inicial da escola e ir à polícia para abrir um boletim de ocorrência me parecia algo sensato a ser feito. Decidi passar em casa para pegar a certidão de nascimento e algumas fotos, para entregar na delegacia, uns 500m antes de chegar em casa, vejo minha filha sentada em uma   mureta, parei o carro, tentando controlar a minha tremedeira e perguntei se ela queria uma carona, ela me respondeu que sim, que tava com sede e muito calor. Avisei a todos que estavam empenhados no resgate dessa mini humana que ela estava comigo e bem. Simplesmente a escola liberou a turma e como ela não me encontrou, decidiu voltar a pé, caminhando junto com outras crianças e adultos pelas ruas. Ninguém parou essa criança de 5!!! anos com uma mochila nas costas andando sozinha pela avenida. A professora da turma na escola não percebeu que não tinha um adulto responsável pela menina na saída, outras Mães presentes ali no momento também não se questionaram e o modo automático prevaleceu de modo generalizado. Apenas nestas situações a gente visualiza a precariedade de sistemas ditos seguros, de quanto o coletivo pode ser falho, infelizmente não foi um sonho, mas um causo com final ainda bem, muito feliz!

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