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O Burro e Eu – Heidi Lauterbach

“I-aaaa, i-aaaa”, gritou o burro. Se fosse um burro alemão, estaria dizendo, num dos muitos dialetos alemães, “eu também, eu também!” Mas ele é um burro brasileiro, e pelo jeito muito bem atualizado, pois o que mais ele estaria gritando do que “Inteligência Artificial, Inteligência Artificial”? Se ele sabe o que significa, devo concluir que eu sou bem mais burro do que ele, pois estou tentando há meses entender esta ameaça à inteligência humana. Como é possível que uma máquina que, com um único operador, consegue fazer o trabalho de cem operários nas plantações de cana por exemplo, e ainda está sendo aclamada como milagre do progresso?  Uma máquina que custa milhões de reais, é desejada pelos fazendeiros, recebe todos os cuidados imagináveis, e que deixou cem homens sem emprego, à deriva da vida. Homens que não encontram outro trabalho, que não sabem como alimentar a família. A inteligência Humana não deveria prevalescer?

E absolutamente apavorante a definição que achei: Que… A IA é um campo da ciência que cria computadores e máquinas que podem raciocinar, aprender, e atuar de maneira que normalmente exigiria inteligência humana… E o que vou fazer com minha inteligência que considero razoável, média? Será que vai ser construído – em alguma nuvem naturalmente – um banco de amostras da inteligência humana análogo ao banco genético de sementes que existe na Noruega? E se uma máquina criada pela IA pira? Não achei nenhum indício de que, no patamar atual do cérebro humano, existe um botão que controla esta IA.

Em 1797, Goethe escreveu o poema “O Aprendiz de Feiticeiro”. O estagiário do feiticeiro aproveita-se da ausência do mestre e, tendo memorizado a palavra mágica, transforma um pedaço de pau em vassoura ordenando que esta faça o trabalho de limpeza. Funciona muito bem, ele se anima, transforma a vassoura em figura humana com cabeça, mãos e pés e se senta para assistir a faxina. A vassoura corre, joga baldes e mais baldes de água no recinto, e o estagiário quer que pare. Só que não se lembra da palavra mágica e assiste horrorizado o trabalho frenético da vassoura. Se joga em cima dela, quebrando-a no meio, mas prontamente nascem duas vassouras novas, correndo para jogar água na oficina. O caos só acaba quando o mestre volta e diz a palavra mágica.

Você quer saber quem foi o mestre? “I-aaaa“, grita o burro alemão.

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